Este período ficou marcado pela vinda da Família Real portuguesa para o Brasil, no ano de 1808, e significou o início do processo de Independência da Colônia.
O período compreendido entre 1808 e 1836 é considerado de transição na literatura brasileira devido à transferência do poder de Portugal para as terras brasileiras que trouxe consigo, além da corte e da realeza, as novidades e modelos literários do Velho Continente nos moldes franceses e ingleses. Houve também a mudança de foco artístico e cultural, da Bahia para o Rio de Janeiro, capital da colônia desde o ano de 1763.
O crítico literário Antônio Cândido descreveu, mais tarde, em seu livro “Noções de Análise Histórico-literária” a falta de oferta cultural no Brasil naqueles anos. Ele disse o seguinte:
“No Brasil não havia universidades, nem tipografias, nem periódicos. Além da primária, a instrução se limitava à formação de clérigos e ao nível que hoje chamamos secundário, as bibliotecas eram poucas e limitadas aos conventos, o teatro era paupérrimo, e muito fraco o intercâmbio entre os núcleos povoados do país, sendo dificílima a entrada de livros.”
Esta observação feita por Antônio Cândido explica o desenvolvimento literário incipiente, se comparado com o mesmo período na metrópole. Os autores vistos até então eram produto da educação europeia e/ou religiosa que recebiam, ou seja, não tinham uma identidade e toda a sua educação cultural era influenciada por escritores estrangeiros. Com a vinda da Família Real, os livros puderam ser impressos no território brasileiro e, com isto, os brasileiros tinham mais acesso á livros e obras dos escritores nacionais. Devido à Imprensa Régia, que derrubou a medida que proibia sua impressão e difusão sem a autorização prévia de Portugal, dando início não apenas ao desenvolvimento da literatura, mas também a um sentimento de nacionalidade no território, uma das principais características do período romântico brasileiro. E este fato influenciou bastante na independência do Brasil em relação à Portugal.
O fato marcante que aconteceu nas primeiras décadas do século XIX foi a chegada da Missão Artística Francesa, em 1816. Esta Missão foi contratada pelo príncipe-regente D. João. Muitos artistas vieram para o Rio de Janeiro, que era o centro das decisões politicas. Entre outros artistas havia os pintores Jean-Baptiste Debret e Nicolas Antoine Taunay, que era avô do Visconde de Taunay.
A Missão Artística Francesa foi um grupo de artistas e artífices franceses que, deslocando-se para o Brasil no início do século XIX, revolucionou o panorama das Belas-Artes no país introduzindo o sistema de ensino superior acadêmico e fortalecendo o Neoclassicismo que ali estava iniciando seu aparecimento. O grupo era liderado por Joachim Lebreton e foi amparado pelo governo de Dom João VI, mas seu trabalho tardou a frutificar, encontrando a resistência da tradição barroca firmemente enraizada e tendo de enfrentar a escassez de recursos financeiros e uma série de intrigas políticas que dissolveram boa parte do primeiro entusiasmo oficial pelo projeto.
A Missão aportou no Rio de Janeiro a 26 de março de 1816, a bordo do navio Calpe, escoltado por navios ingleses, e era formado, segundo Neves, por Joachim Lebreton, o líder, Jean Baptiste Debret, pintor histórico, Nicolas-Antoine Taunay, pintor de paisagens e cenas históricas, Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny, arquiteto, junto com seus discípulos Charles de Lavasseur e Louis Ueier,Auguste Marie Taunay, escultor, Charles-Simon Pradier, gravador, François Ovide, mecânico, Jean Baptiste Leve, ferreiro, Nicolas Magliori Enout, serralheiro, Pelite e Fabre, peleteiros, Louis Jean Roy e seu filho Hypolite, carpinteiros, François Bonrepos, auxiliar de escultura, e Félix Taunay, filho de Nicolas-Antoine, ainda apenas um jovem aprendiz. Muitos deles trouxeram suas famílias, criados e outros auxiliares. Pinassi acrescenta ainda os nomes de Sigismund Neukomm, músico, e Pierre Dillon, secretário de Lebreton. Seis meses mais tarde, uniram-se ao grupo Marc Ferrez, escultor (tio do fotógrafo Marc Ferrez) e Zéphyrin Ferrez, gravador de medalhas.
Em 12 de junho de 1816 Lebreton elaborou um memorando para o Conde da Barca onde propôs instaurar uma nova metodologia de ensino através da criação de uma escola superior de Belas Artes com disciplinas sistematizadas e graduadas. O ensino se daria em três fases:
Esse projeto tinha um perfil muito contrastante com o sistema de ensino e circulação de arte até então prevalente no Brasil. Havia uma significativa tradição artística local, como prova o rico legado de arte barroca que ainda sobrevive no país, mas seus métodos eram em tudo diversos. O aprendizado ainda seguia o modelo informal das corporações de ofícios medievais, o status de artista nem era reconhecido, antes eram considerados meros artesãos especializados, cuja inserção na sociedade era apenas marginal, e as temáticas privilegiadas por esse produtores eram basicamente religiosas, uma vez que praticamente não havia mercado algum para a arte profana, mesmo a nobreza radicada na terra parecia pouco inclinada para os assuntos artísticos, e tudo que se criava era encomendado pela Igreja Católica para a decoração dos templos e mosteiros. Diante desse quadro, o sistema brasileiro de arte da época não estava capacitado para a produção de uma arte palaciana como a que desejava a corte, e assim se explica a rápida encampação do projeto de Lebreton pela monarquia no exílio, considerando-o o marco inaugural da entrada no Brasil na “verdadeira” civilização. A Missão chegou ao Brasil imbuída de altos propósitos, como escreveu Debret:
Mas a realidade contradisse suas expectativas. Embora com o apoio real, a missão encontrou resistência entre os artistas nativos, ainda seguidores do Barroco, e ameaçavam a posição de mestres portugueses já estabelecidos. A verdade é que os franceses foram recebidos como importunos tanto por portugueses quanto por brasileiros. A rainha D. Maria I faleceu em 1816, e o projeto de modernização da capital avançava lentamente. O governo central tinha muitas outras preocupações a atender – o acompanhamento da instável situação na Europa, uma revolução em Pernambuco, as constantes demandas administrativas internas, o alto custo de manutenção da corte, uma recessão provocada pela drástica queda no preço internacional do açúcar e do algodão, uma grave seca no Nordeste que desestruturou a economia regional, e os conflitos de fronteira no sul na Questão Cisplatina, subtraindo recursos e atenção do projeto cultural francês. O principal e um dos únicos verdadeiros incentivadores do projeto, o Conde da Barca, faleceu no ano seguinte, o contrato dos artistas foi posto em discussão e o cônsul francês no Brasil, coronel Maler, não via com bons olhos a presença de bonapartistas, sendo mais tarde acusado por Taunay de ser o principal entrave ao bom desenvolvimento do projeto.
Enquanto a Escola não era instalada definitivamente, ficando à mercê das oscilações políticas e sofrendo modificações no projeto original, sucumbindo, como lamentava Debret, aos “aos erros e vícios do ancien régime”, os artistas sobreviviam da pensão que lhes concedera o governo, e ocupavam-se aceitando encomendas de retratos e organizando festas suntuosas para a corte, ao lado das aulas que conseguiam ministrar nas precárias condições em que se achou o projeto nos primeiros anos. O próprio grupo enfrentava dissidências internas, lutas pelo poder, e Lebreton foi acusado de favorecimentos indevidos e má administração, e teve de se isolar de todos, falecendo em seguida, em 1819. Como seu sucessor foi nomeado o português, professor de Desenho, Henrique José da Silva, artista conservador, ferrenho crítico dos franceses. O seu primeiro gesto foi liberar os franceses de suas obrigações como professores. Tantas foram as dificuldades que Nicolas-Antoine Taunay abandonou o país em 1821 (ano da morte de Napoleão), deixando para trás o seu filho, Félix Taunay. Pouco depois o Taunay escultor também faleceu, desfalcando ainda mais o grupo primitivo, do qual foram efetivamente aproveitados pelo governo apenas cinco integrantes: Debret, Nicolas Taunay, Auguste Taunay, Montigny e Ovide.
Passaram dez anos antes de a Missão dar seus primeiros frutos significativos, com a inauguração, em 5 de novembro de 1826, com a presença de D. Pedro I, da Academia Imperial. Em 1831, Debret também retornou à França.
Os integrantes da Missão executaram diversos trabalhos para a família real, relacionados às datas e fatos comemorativos da monarquia, como as cerimônias de aclamação de D. João VI (1817) e as comemorativas da vinda da futura imperatriz Leopoldina (1817), assim como os festejos para a aclamação e coroação de D. Pedro I em 1822. Estes eventos envolveram a criação de obras de arquitetura efêmera, como arcos de triunfo, obeliscos e ornamentos para a cidade. Também deixaram uma importante série de retratos oficiais de personalidades e membros da nobreza e registros variados da vida na corte e na cidade
Lebreton foi a força organizadora inicial do projeto. Diante das intrigas em torno da Missão, e tendo uma personalidade difícil, atritou-se com todos e retirou-se para uma propriedade do Flamengo, falecendo poucos anos depois. As 50 obras de arte que adquiriu na França e trouxe consigo formam um dos núcleos iniciais da atual coleção do Museu Nacional de Belas Artes. Debret, cujo atelier se encontrava no bairro do Catumbi, foi o que teve maior êxito no registrar os usos e costumes do país, as tradições anacrônicas da corte portuguesa, como por exemplo o beija-mão. Além de converter-se em pintor oficial do Primeiro Reinado, Debret, sobrinho de David, deixa-se encantar pelas paisagens exuberantes e inéditas, os costumes barrocos, e nas horas em que não lecionava, registrou-os em uma sucessão de desenhos e aquarelas que os retratam, e que anos mais tarde, já de volta à França, ele publicou na Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Tais imagens são uma inestimável documentação visual da época, e fonte básica para o estudo da cultura e paisagem brasileiras de então.
Já Grandjean de Montigny trabalhou para transformar a paisagem urbanística do Rio de Janeiro, elaborando o projeto da primeira sede oficial da Academia, do qual infelizmente só resta o pórtico, da primeira sede da Alfândega, obra concluída em 1820, e que hoje abriga a Casa França-Brasil, e diversas outras obras de saneamento e urbanização, além de ter formado cerca de vinte novos arquitetos, entre eles José Maria Jacinto Rebelo, Teodoro de Oliveira, Joaquim Cândido Guilhobel, Domingos Monteiro e Francisco Joaquim Béthencourt da Silva.
Nicolas Taunay, que chegou ao Brasil com cerca de 60 anos, jamais se adaptou completamente ao contexto local, mas realizou bela documentação da paisagem em suas telas. Seu filho Félix seria mais tarde Diretor da Academia Imperial, além de realizar obra individual de mérito, e seu outro filho, Adrien, foi desenhista da expedição Langsdorff, nos anos 1820, deixando importantes registros visuais do interior.
Auguste Taunay foi nomeado professor da Escola Real, mas não chegou a ocupar efetivamente o cargo. Realizou decorações na cidade do Rio na aclamação de D. João VI. Deu aulas em regime livre, sendo mestre de José Jorge Duarte, Xisto Antônio Pires, Manuel Ferreira Lagos, Cândido Mateus Farias, João José da Silva Monteiro e José da Silva Santos.
A Missão teve um papel importante na atualização do Brasil em relação ao que ocorria na Europa na época, foi a modernidade em seu tempo. Embora o tenha exercitado de forma sistemática, não foi a primeira nem a única força responsável pela difusão do Neoclassicismo no país, já perceptível na obra de diversos artistas precursores atuando aqui desde fins do século XVIII, como Antonio Landi e Mestre Valentim na arquitetura, Manuel Dias de Oliveira na pintura e na música os últimos integrantes da Escola Mineira, como Lobo de Mesquita e João de Deus de Castro Lobo. Mas é certo que os princípios estéticos que a Missão defendia foram com o tempo adotados quase na íntegra e se tornaram naturais, integrando o novo dado à história nacional, tradição fortalecida na gestão de Félix-Emile Taunay, filho de Nicolas, à frente da AIBA. O projeto já foi criticado modernamente como uma invasão consentida, uma intervenção violenta e repressora no desenvolvimento cultural brasileiro, que ainda trazia forte herança barroca e há pouco encontrara a maturidade em artistas como Mestre Ataíde e Aleijadinho, mas com o apoio oficial aos artistas neoclássicos a transição para a nova estética foi acelerada, e com isso tumultuada.
Por outro lado, sua importância como fundadores de um novo sistema de ensino não pode ser negligenciada, já que a Academia, mesmo encontrando na origem sérios empecilhos e demorando para frutificar, tornar-se-ia mais adiante a mais importante instituição oficial de arte no Brasil, e nela se formariam gerações dos maiores artistas brasileiros, atestando a validade do método proposto. A atuação dos franceses também contribuiu para melhorar o status do artista, assumindo uma postura de cidadãos livres, profissionais, numa sociedade em vias de laicização, e não mais submetidos à Igreja e seus temas, como se observava nos tempos anteriores. As noções de saneamento e higiene que trouxeram iriam modificar o urbanismo das cidades.
Foram os fundadores da arte acadêmica como estilo no Brasil, uma arte cultivada pelo estado e organizada dentro de linhas metodológicas rígidas, com temáticas próprias, modelos formais próprios, exames de aptidão e sistema de premiações, e boa parcela de censura a originalidades suspeitas de romper os cânones consagrados; tal organização chocava o hábito de séculos, pois até ali a Igreja havia sido o grande mecenas, e suas orientações eram diferentes. Desdenhada por uns, aplaudida por outros, sem sombra de dúvida a arte acadêmica, que floriu imensamente da segunda metade do século XIX até o início do seguinte, herdeira direta dos franceses repudiados e de seu sistema, foi o veículo formal de boa parte dos mais vigorosos monumentos da história da arte nacional de todos os tempos.
Foram os franceses os qualificados professores da primeira geração de artistas nacionais educados em escola pública, segundo um sistema profissionalizante inédito, e estes formaram muitos outros de grande valor segundo os mesmos princípios. Basta dar um lance de olhos na listagem de artistas formados pela Academia nas décadas seguintes que se verá uma pletora de mestres: Victor Meirelles, Almeida Júnior, Rodolfo Amoedo, Henrique Bernardelli, Pedro Américo, Eliseu Visconti, Artur Timóteo da Costa, Belmiro de Almeida, e tantos outros, que conseguiram, graças à sólida formação recebida na escola, retratar o Brasil em grande estilo, chegando a criar obras que se tornaram ícones nacionais.
Tal atividade intensa atraiu a presença no pais de mais bom número de outros estrangeiros, como Georg Grimm, Castagneto, François-René Moreau, Eduardo de Martino, que deram sua contribuição adicional à cultura do Brasil. Essa tradição só se interrompeu com a absorção da Academia, depois Escola Nacional de Belas Artes, pela atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, exatamente quando o Modernismo aparecia com força na cena encerrando um grande ciclo cultural e a República reorganizava o sistema de ensino superior.
O período compreendido entre 1808 e 1836 é considerado de transição na literatura brasileira devido à transferência do poder de Portugal para as terras brasileiras que trouxe consigo, além da corte e da realeza, as novidades e modelos literários do Velho Continente nos moldes franceses e ingleses. Houve também a mudança de foco artístico e cultural, da Bahia para o Rio de Janeiro, capital da colônia desde o ano de 1763.
O crítico literário Antônio Cândido descreveu, mais tarde, em seu livro “Noções de Análise Histórico-literária” a falta de oferta cultural no Brasil naqueles anos. Ele disse o seguinte:
“No Brasil não havia universidades, nem tipografias, nem periódicos. Além da primária, a instrução se limitava à formação de clérigos e ao nível que hoje chamamos secundário, as bibliotecas eram poucas e limitadas aos conventos, o teatro era paupérrimo, e muito fraco o intercâmbio entre os núcleos povoados do país, sendo dificílima a entrada de livros.”
Esta observação feita por Antônio Cândido explica o desenvolvimento literário incipiente, se comparado com o mesmo período na metrópole. Os autores vistos até então eram produto da educação europeia e/ou religiosa que recebiam, ou seja, não tinham uma identidade e toda a sua educação cultural era influenciada por escritores estrangeiros. Com a vinda da Família Real, os livros puderam ser impressos no território brasileiro e, com isto, os brasileiros tinham mais acesso á livros e obras dos escritores nacionais. Devido à Imprensa Régia, que derrubou a medida que proibia sua impressão e difusão sem a autorização prévia de Portugal, dando início não apenas ao desenvolvimento da literatura, mas também a um sentimento de nacionalidade no território, uma das principais características do período romântico brasileiro. E este fato influenciou bastante na independência do Brasil em relação à Portugal.
O fato marcante que aconteceu nas primeiras décadas do século XIX foi a chegada da Missão Artística Francesa, em 1816. Esta Missão foi contratada pelo príncipe-regente D. João. Muitos artistas vieram para o Rio de Janeiro, que era o centro das decisões politicas. Entre outros artistas havia os pintores Jean-Baptiste Debret e Nicolas Antoine Taunay, que era avô do Visconde de Taunay.
A Missão Artística Francesa foi um grupo de artistas e artífices franceses que, deslocando-se para o Brasil no início do século XIX, revolucionou o panorama das Belas-Artes no país introduzindo o sistema de ensino superior acadêmico e fortalecendo o Neoclassicismo que ali estava iniciando seu aparecimento. O grupo era liderado por Joachim Lebreton e foi amparado pelo governo de Dom João VI, mas seu trabalho tardou a frutificar, encontrando a resistência da tradição barroca firmemente enraizada e tendo de enfrentar a escassez de recursos financeiros e uma série de intrigas políticas que dissolveram boa parte do primeiro entusiasmo oficial pelo projeto.
A Missão aportou no Rio de Janeiro a 26 de março de 1816, a bordo do navio Calpe, escoltado por navios ingleses, e era formado, segundo Neves, por Joachim Lebreton, o líder, Jean Baptiste Debret, pintor histórico, Nicolas-Antoine Taunay, pintor de paisagens e cenas históricas, Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny, arquiteto, junto com seus discípulos Charles de Lavasseur e Louis Ueier,Auguste Marie Taunay, escultor, Charles-Simon Pradier, gravador, François Ovide, mecânico, Jean Baptiste Leve, ferreiro, Nicolas Magliori Enout, serralheiro, Pelite e Fabre, peleteiros, Louis Jean Roy e seu filho Hypolite, carpinteiros, François Bonrepos, auxiliar de escultura, e Félix Taunay, filho de Nicolas-Antoine, ainda apenas um jovem aprendiz. Muitos deles trouxeram suas famílias, criados e outros auxiliares. Pinassi acrescenta ainda os nomes de Sigismund Neukomm, músico, e Pierre Dillon, secretário de Lebreton. Seis meses mais tarde, uniram-se ao grupo Marc Ferrez, escultor (tio do fotógrafo Marc Ferrez) e Zéphyrin Ferrez, gravador de medalhas.
Em 12 de junho de 1816 Lebreton elaborou um memorando para o Conde da Barca onde propôs instaurar uma nova metodologia de ensino através da criação de uma escola superior de Belas Artes com disciplinas sistematizadas e graduadas. O ensino se daria em três fases:
- Desenho geral e cópia de modelos dos mestres, para todos os alunos;
- Desenho de vultos e da natureza, e elementos de modelagem para os escultores;
- Pintura acadêmica com modelo vivo para pintores; escultura com modelo vivo para escultores, e estudo no atelier de mestres gravadores e mestres desenhistas para os alunos destas especialidades.
- Na teoria:
- História da arquitetura através de estudo dos antigos;
- Construção e perspectiva;
- Estereotomia.
- Na prática:
- Desenho;
- Cópia de modelos e estudo de dimensões;
- Composição.
Esse projeto tinha um perfil muito contrastante com o sistema de ensino e circulação de arte até então prevalente no Brasil. Havia uma significativa tradição artística local, como prova o rico legado de arte barroca que ainda sobrevive no país, mas seus métodos eram em tudo diversos. O aprendizado ainda seguia o modelo informal das corporações de ofícios medievais, o status de artista nem era reconhecido, antes eram considerados meros artesãos especializados, cuja inserção na sociedade era apenas marginal, e as temáticas privilegiadas por esse produtores eram basicamente religiosas, uma vez que praticamente não havia mercado algum para a arte profana, mesmo a nobreza radicada na terra parecia pouco inclinada para os assuntos artísticos, e tudo que se criava era encomendado pela Igreja Católica para a decoração dos templos e mosteiros. Diante desse quadro, o sistema brasileiro de arte da época não estava capacitado para a produção de uma arte palaciana como a que desejava a corte, e assim se explica a rápida encampação do projeto de Lebreton pela monarquia no exílio, considerando-o o marco inaugural da entrada no Brasil na “verdadeira” civilização. A Missão chegou ao Brasil imbuída de altos propósitos, como escreveu Debret:
Mas a realidade contradisse suas expectativas. Embora com o apoio real, a missão encontrou resistência entre os artistas nativos, ainda seguidores do Barroco, e ameaçavam a posição de mestres portugueses já estabelecidos. A verdade é que os franceses foram recebidos como importunos tanto por portugueses quanto por brasileiros. A rainha D. Maria I faleceu em 1816, e o projeto de modernização da capital avançava lentamente. O governo central tinha muitas outras preocupações a atender – o acompanhamento da instável situação na Europa, uma revolução em Pernambuco, as constantes demandas administrativas internas, o alto custo de manutenção da corte, uma recessão provocada pela drástica queda no preço internacional do açúcar e do algodão, uma grave seca no Nordeste que desestruturou a economia regional, e os conflitos de fronteira no sul na Questão Cisplatina, subtraindo recursos e atenção do projeto cultural francês. O principal e um dos únicos verdadeiros incentivadores do projeto, o Conde da Barca, faleceu no ano seguinte, o contrato dos artistas foi posto em discussão e o cônsul francês no Brasil, coronel Maler, não via com bons olhos a presença de bonapartistas, sendo mais tarde acusado por Taunay de ser o principal entrave ao bom desenvolvimento do projeto.
Enquanto a Escola não era instalada definitivamente, ficando à mercê das oscilações políticas e sofrendo modificações no projeto original, sucumbindo, como lamentava Debret, aos “aos erros e vícios do ancien régime”, os artistas sobreviviam da pensão que lhes concedera o governo, e ocupavam-se aceitando encomendas de retratos e organizando festas suntuosas para a corte, ao lado das aulas que conseguiam ministrar nas precárias condições em que se achou o projeto nos primeiros anos. O próprio grupo enfrentava dissidências internas, lutas pelo poder, e Lebreton foi acusado de favorecimentos indevidos e má administração, e teve de se isolar de todos, falecendo em seguida, em 1819. Como seu sucessor foi nomeado o português, professor de Desenho, Henrique José da Silva, artista conservador, ferrenho crítico dos franceses. O seu primeiro gesto foi liberar os franceses de suas obrigações como professores. Tantas foram as dificuldades que Nicolas-Antoine Taunay abandonou o país em 1821 (ano da morte de Napoleão), deixando para trás o seu filho, Félix Taunay. Pouco depois o Taunay escultor também faleceu, desfalcando ainda mais o grupo primitivo, do qual foram efetivamente aproveitados pelo governo apenas cinco integrantes: Debret, Nicolas Taunay, Auguste Taunay, Montigny e Ovide.
Passaram dez anos antes de a Missão dar seus primeiros frutos significativos, com a inauguração, em 5 de novembro de 1826, com a presença de D. Pedro I, da Academia Imperial. Em 1831, Debret também retornou à França.
Os integrantes da Missão executaram diversos trabalhos para a família real, relacionados às datas e fatos comemorativos da monarquia, como as cerimônias de aclamação de D. João VI (1817) e as comemorativas da vinda da futura imperatriz Leopoldina (1817), assim como os festejos para a aclamação e coroação de D. Pedro I em 1822. Estes eventos envolveram a criação de obras de arquitetura efêmera, como arcos de triunfo, obeliscos e ornamentos para a cidade. Também deixaram uma importante série de retratos oficiais de personalidades e membros da nobreza e registros variados da vida na corte e na cidade
Lebreton foi a força organizadora inicial do projeto. Diante das intrigas em torno da Missão, e tendo uma personalidade difícil, atritou-se com todos e retirou-se para uma propriedade do Flamengo, falecendo poucos anos depois. As 50 obras de arte que adquiriu na França e trouxe consigo formam um dos núcleos iniciais da atual coleção do Museu Nacional de Belas Artes. Debret, cujo atelier se encontrava no bairro do Catumbi, foi o que teve maior êxito no registrar os usos e costumes do país, as tradições anacrônicas da corte portuguesa, como por exemplo o beija-mão. Além de converter-se em pintor oficial do Primeiro Reinado, Debret, sobrinho de David, deixa-se encantar pelas paisagens exuberantes e inéditas, os costumes barrocos, e nas horas em que não lecionava, registrou-os em uma sucessão de desenhos e aquarelas que os retratam, e que anos mais tarde, já de volta à França, ele publicou na Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Tais imagens são uma inestimável documentação visual da época, e fonte básica para o estudo da cultura e paisagem brasileiras de então.
Já Grandjean de Montigny trabalhou para transformar a paisagem urbanística do Rio de Janeiro, elaborando o projeto da primeira sede oficial da Academia, do qual infelizmente só resta o pórtico, da primeira sede da Alfândega, obra concluída em 1820, e que hoje abriga a Casa França-Brasil, e diversas outras obras de saneamento e urbanização, além de ter formado cerca de vinte novos arquitetos, entre eles José Maria Jacinto Rebelo, Teodoro de Oliveira, Joaquim Cândido Guilhobel, Domingos Monteiro e Francisco Joaquim Béthencourt da Silva.
Nicolas Taunay, que chegou ao Brasil com cerca de 60 anos, jamais se adaptou completamente ao contexto local, mas realizou bela documentação da paisagem em suas telas. Seu filho Félix seria mais tarde Diretor da Academia Imperial, além de realizar obra individual de mérito, e seu outro filho, Adrien, foi desenhista da expedição Langsdorff, nos anos 1820, deixando importantes registros visuais do interior.
Auguste Taunay foi nomeado professor da Escola Real, mas não chegou a ocupar efetivamente o cargo. Realizou decorações na cidade do Rio na aclamação de D. João VI. Deu aulas em regime livre, sendo mestre de José Jorge Duarte, Xisto Antônio Pires, Manuel Ferreira Lagos, Cândido Mateus Farias, João José da Silva Monteiro e José da Silva Santos.
A Missão teve um papel importante na atualização do Brasil em relação ao que ocorria na Europa na época, foi a modernidade em seu tempo. Embora o tenha exercitado de forma sistemática, não foi a primeira nem a única força responsável pela difusão do Neoclassicismo no país, já perceptível na obra de diversos artistas precursores atuando aqui desde fins do século XVIII, como Antonio Landi e Mestre Valentim na arquitetura, Manuel Dias de Oliveira na pintura e na música os últimos integrantes da Escola Mineira, como Lobo de Mesquita e João de Deus de Castro Lobo. Mas é certo que os princípios estéticos que a Missão defendia foram com o tempo adotados quase na íntegra e se tornaram naturais, integrando o novo dado à história nacional, tradição fortalecida na gestão de Félix-Emile Taunay, filho de Nicolas, à frente da AIBA. O projeto já foi criticado modernamente como uma invasão consentida, uma intervenção violenta e repressora no desenvolvimento cultural brasileiro, que ainda trazia forte herança barroca e há pouco encontrara a maturidade em artistas como Mestre Ataíde e Aleijadinho, mas com o apoio oficial aos artistas neoclássicos a transição para a nova estética foi acelerada, e com isso tumultuada.
Por outro lado, sua importância como fundadores de um novo sistema de ensino não pode ser negligenciada, já que a Academia, mesmo encontrando na origem sérios empecilhos e demorando para frutificar, tornar-se-ia mais adiante a mais importante instituição oficial de arte no Brasil, e nela se formariam gerações dos maiores artistas brasileiros, atestando a validade do método proposto. A atuação dos franceses também contribuiu para melhorar o status do artista, assumindo uma postura de cidadãos livres, profissionais, numa sociedade em vias de laicização, e não mais submetidos à Igreja e seus temas, como se observava nos tempos anteriores. As noções de saneamento e higiene que trouxeram iriam modificar o urbanismo das cidades.
Foram os fundadores da arte acadêmica como estilo no Brasil, uma arte cultivada pelo estado e organizada dentro de linhas metodológicas rígidas, com temáticas próprias, modelos formais próprios, exames de aptidão e sistema de premiações, e boa parcela de censura a originalidades suspeitas de romper os cânones consagrados; tal organização chocava o hábito de séculos, pois até ali a Igreja havia sido o grande mecenas, e suas orientações eram diferentes. Desdenhada por uns, aplaudida por outros, sem sombra de dúvida a arte acadêmica, que floriu imensamente da segunda metade do século XIX até o início do seguinte, herdeira direta dos franceses repudiados e de seu sistema, foi o veículo formal de boa parte dos mais vigorosos monumentos da história da arte nacional de todos os tempos.
Foram os franceses os qualificados professores da primeira geração de artistas nacionais educados em escola pública, segundo um sistema profissionalizante inédito, e estes formaram muitos outros de grande valor segundo os mesmos princípios. Basta dar um lance de olhos na listagem de artistas formados pela Academia nas décadas seguintes que se verá uma pletora de mestres: Victor Meirelles, Almeida Júnior, Rodolfo Amoedo, Henrique Bernardelli, Pedro Américo, Eliseu Visconti, Artur Timóteo da Costa, Belmiro de Almeida, e tantos outros, que conseguiram, graças à sólida formação recebida na escola, retratar o Brasil em grande estilo, chegando a criar obras que se tornaram ícones nacionais.
Tal atividade intensa atraiu a presença no pais de mais bom número de outros estrangeiros, como Georg Grimm, Castagneto, François-René Moreau, Eduardo de Martino, que deram sua contribuição adicional à cultura do Brasil. Essa tradição só se interrompeu com a absorção da Academia, depois Escola Nacional de Belas Artes, pela atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, exatamente quando o Modernismo aparecia com força na cena encerrando um grande ciclo cultural e a República reorganizava o sistema de ensino superior.
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